3 crenças do trauma do desenvolvimento e os problemas que causam

Os eventos traumáticos mudam a nossa percepção acerca de nós mesmos, do mundo e dos outros a nossa volta. Como o nosso senso de segurança e confiança é abalado, e, por vezes, até destruído, “aprendemos”, através da dor que sentimos, a alterar as nossas visões para nos adaptarmos, cognitiva e emocionalmente, às nossas circunstâncias. No trauma do desenvolvimento – uma série de experiências adversas na infância afeta o desenvolvimento – essa mudança é bastante dramática e tende a transcender o tempo e a idade. Na prática, este processo pode ser observado no adulto que, quando criança, foi repetidas vezes criticado e atacado verbalmente por uma mãe e/ou pai abusivo, por exemplo, e cujas crenças rígidas e negativas resultantes do trauma impedem-no de manter uma visão coerente de si mesmo como um adulto competente e digno de ser amado. Essas crenças também o avisam dos perigos do amor e da intimidade, os quais, supostamente, afligem todos os relacionamentos. Vivendo em um mundo onde a segurança não pode ser sentida nem mesmo dentro do ambiente familiar, essa vítima do trauma do desenvolvimento sente-se vazia e perdida, como se a sua ferida existencial não tivesse cura.
Como as crenças disfuncionais desembocam em estratégias de enfrentamento disfuncionais, e essas, por sua vez, em problemas de saúde mental e relacionamentos, é vital tornar-se consciente de como o seu pensamento pode estar afetando a sua felicidade. Se você suspeita ter sido vítima deste tipo de trauma e deseja informar-se sobre os seus efeitos, aqui estão 3 crenças do trauma de desenvolvimento e os problemas que causam:
1- “Não posso confiar nos outros”
As vítimas de traumas desenvolvimento apresentam grande dificuldade de acreditar e confiar nas outras pessoas, pois tiveram a sua confiança quebrada muito cedo na vida e em uma fase de intensa vulnerabilidade. Nestes casos, nos quais a traição é cometida por aqueles de quem eram próximos – ou seja, os adultos responsáveis pelos seus cuidados, tal como a mãe e/ou pai – o dano causado é muito maior. Seu medo de rejeição e abandono, mesmo quando completamente injustificado e não relacionado às circunstâncias atuais, resulta, em geral, na autossuficiência obsessiva. A falta de fé nas boas intenções das outras pessoas e na capacidade destas se tornarem uma influência positiva em suas vidas os impossibilita de pedirem e aceitarem ajuda. Essa tendência não apenas dá origem a comportamentos codependentes e à solidão, assim como aumenta a probabilidade de ter depressão devido à necessidade de se isolar ou negligenciar os próprios sentimentos quando passa por momentos difíceis. Um relacionamento saudável consigo mesmo e com os outros é raramente alcançado sem um esforço e dedicação conscientes.
2- “Eu não sou digno de ser amado”
Quando uma criança não tem seus sentimentos validados ou é constantemente atacada ou ignorada, não consegue separar a raiva e a atitude negligente dos pais do seu senso de valor próprio. Como as crianças não têm a sofisticação intelectual de um adulto, logo associam a atitude dos pais, consigo mesma, como se os dois estivessem intrinsecamente relacionados (“Se a minha mãe não está interessada em mim/está brava comigo, é porque eu sou chato/não sou bom o suficiente”). Naturalmente, esse sentimento de inadequação também se encontra presente nas crianças que são abusadas física e/ou psicológica e emocionalmente. A fim de lidar com este sentimento torturante e originado da crença de que “há algo de errado comigo”, essas vítimas empenham-se muito para serem notadas e se sentirem dignas de amor e aceitação. Portanto, a sua autoestima é baixa e acaba sendo “construída” de fora para dentro por meio do amor condicional. Elas se tornam perfeccionistas, codependentes, viciadas em aprovação e em agradar os outros e acham difícil dizer não, comportamentos motivados por um poderoso medo de rejeição.
3- “O mundo é um lugar perigoso”
Crescer com medo cria um estado de alerta que molda a maneira como o cérebro se desenvolve e processa as informações sobre o ambiente. Uma criança criada por pais emocionalmente instáveis, ansiosos, inconsistentes e/ou imprevisíveis, vê o mundo como um lugar perigoso e repleto de ameaças ao seu bem-estar. Guiada pelos pensamentos de que “algo de ruim está prestes a acontecer” e “eu sou fraco/vulnerável”, assim como a ansiedade que os seguem, seu comportamento torna-se governado pelo medo. O raciocínio negativo e tendencioso da vítima aliado a sua baixa autoconfiança transformam tudo em um desafio. Fazer mudanças, criar novos hábitos, assumir riscos, se autoafirmar e conhecer novas pessoas, bem como outros comportamentos semelhantes que exijam autoconfiança, por exemplo, são uma fonte de mal-estar e, em alguns casos, até de pânico. A alta ansiedade destrói a motivação, além de afetar o sono, a saúde física e atrasar ou até impedir a realização pessoal, acadêmica e profissional. Por conseguinte, os relacionamentos também são afetados. A ansiedade, como um poderoso assassino de humor, faz com que pareçamos inacessíveis, indiferentes, distantes e até difíceis, geralmente, características não apreciadas por aqueles que se sentem íntegros e são emocionalmente inteligentes.
Por mais deprimente que tudo isso possa parecer, as crenças do trauma do desenvolvimento podem ser reestruturadas. Se você se identifica com o aqui relatado, comece a questionar ativamente os pensamentos negativos que o impedem de confiar em si mesmo e nas outras pessoas. Seja objetivo quando se flagrar imaginando catástrofes e pare de levar tudo para o lado pessoal. Mantenha-se ciente de que a nossa realidade subjetiva é constituída com base em conhecimento acumulado ao longo dos anos. Lembre-se de que este conhecimento é organizado e classificado por meio das crenças fundamentais, altamente subjetivas e carregadas de significado emocional que não equivalem, portanto, a fatos.